Por Mateus Araújo e Camila Brandalise, do UOL, em São Paulo
Foi durante uma investigação contra o jogo do bicho, no Recife, dois anos atrás, que a Polícia Civil encontrou os primeiros vestígios do que veio a se transformar na Operação Integration, envolvendo bets e celebridades e expondo divergências entre membros do Judiciário.
Nessa investigação sobre lavagem de dinheiro, Gusttavo Lima e Deolane Bezerra passaram de garotos-propaganda de apostas a envolvidos em possíveis crimes.
Gustavo e Deolane, além de outros 18 citados, estão nessa trama de cifras milionárias, compra e venda de avião e carro, iate, sociedades, jogo do bicho e relações com donos de plataforma de apostas e integrantes do poder.
O controle da operação ficou sob a caneta da juíza Andrea Calado, conhecida em Pernambuco por atuar em casos de grande repercussão.
Ela foi criticada por especialistas ouvidos pelo UOL por dar ares de Lava Jato ao processo.
Também há divergências entre Calado, o MP-PE (Ministério Público de Pernambuco) e o desembargador Eduardo Guilliod Maranhão.
Procurada pela reportagem, a juíza não retornou o pedido de entrevista.
Com Calado no comando da Integration, a lotérica Caminho da Sorte e a bet Esportes da Sorte se tornaram os principais alvos.
Com dezenas de casas espalhadas pela capital pernambucana, a Caminho da Sorte, afirma a polícia, pertence a Darwin Henrique da Silva. Já a Esportes da Sorte é do filho dele, Darwin Henrique da Silva Filho.
Ambos viraram investigados por “indícios suficientes de estreita ligação entre as empresas na prática de atividades ilícitas”, segundo o inquérito ao qual o UOL teve acesso.
Eles são suspeitos de exploração de jogo de azar e de lavagem de dinheiro.
Procurados pelo UOL, os advogados que defendem Darwin pai e Darwin Filho disseram que, por enquanto, não vão se pronunciar sobre o caso.
Conflito no Judiciário
Em Pernambuco, colegas da magistrada comparam a atuação dela com a do ex-juiz Sérgio Moro, levantando questionamentos sobre imparcialidade e métodos usados.
As discordâncias vieram a público após Calado mandar prender preventivamente, no início de setembro, os investigados – entre eles a advogada e influencer Deolane Bezerra.
No dia 20, dois dias depois de a Polícia Civil finalizar o seu relatório, o MP-PE (Ministério Público de Pernambuco) publicou uma nota em que avaliava “necessárias algumas diligências complementares”.
Os promotores queriam mais detalhes sobre os investigados e recomendaram que as prisões preventivas fossem substituídas por medidas cautelares.
No dia 23, atendendo a um pedido de habeas corpus feito pela defesa de Darwin Henrique da Silva Filho, o desembargador Eduardo Guilliod Maranhão mandou soltar 17 pessoas.
Ele afirmou não haver elementos para o oferecimento da denúncia nem para a prisão preventiva.
“A prisão dos acusados deve ser imediatamente relaxada sob pena de configuração de constrangimento ilegal.”
Naquele mesmo dia, no entanto, poucas horas antes da decisão do desembargador, a juíza Andrea Calado mandou prender Gusttavo Lima – incluído pela polícia no inquérito, que está sob responsabilidade do delegado Paulo Gondim.
Na ordem, Calado fez críticas ao MP, alegando que no dia 3 de setembro os promotores foram favoráveis à prisão preventiva dos investigados, mas mudaram de opinião após a inclusão do cantor.
Na tarde do dia 24, Maranhão contrariou novamente a colega e atendeu a um novo pedido de habeas corpus, desta vez a favor de Gusttavo Lima, revogando o mandado de prisão.
Ele alegou que, embora as investigações apontem indícios de irregularidades, ainda não há provas suficientes para justificar a prisão preventiva.
Lava Jato dos famosos?
Juristas ouvidos pelo UOL veem “exagero” na decisão de Andrea Calado.
Para o advogado Alexandre Pacheco Martins, especialista em direito penal econômico e direito processual penal, a juíza tenta “substituir” o MP.
“Essa conduta lembra um pouco o que vimos na Lava Jato, quando alguém em um cargo de poder, que deveria ser imparcial, adota uma postura muito mais ligada a uma das partes”, afirma Martins.
“O fato de alguém ter viajado com ele [Gusttavo Lima], em um avião dele, por si só não o transforma em criminoso”, acrescenta, sobre a ordem contra o cantor.
O advogado Dinovan Dumas, também especialista em direito penal econômico, reforça que houve equívoco no caso Gusttavo Lima.
Para ele, a decisão se baseia de forma exagerada no “poder econômico” do cantor, o que pode “ferir a presunção de inocência”.
Embora reconheça o impacto social dos jogos de azar, ele afirma que “não deve ser usado para justificar uma prisão preventiva”, já que essa medida precisa se apoiar em fatos reais, não em avaliações morais.
A relação entre famosos e bets
Gusttavo Lima e Deolane Bezerra são dois dos vários famosos envolvidos com a expansão das bets no país, seja com publicidade ou com negócios com os donos das casas de apostas.
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Fonte: UOL