A nova exigência do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) para proteção da saúde mental dos trabalhadores, que entra em vigor em maio deste ano, trará desafios financeiros significativos para as empresas, principalmente as médias e pequenas. A Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1) obriga as organizações a adotar medidas para identificar e minimizar fatores que afetam a saúde mental dos funcionários, como estresse, assédio moral e excesso de trabalho. Dentre elas, políticas de compliance específicas para evitar ambientes de trabalho tóxicos.
As medidas têm mérito positivo, mas especialistas em Direito do Trabalho apontam falta de clareza sobre como elas devem ser aplicadas. Sem regras precisas, pode haver insegurança jurídica e prejuízos aos pequenos e médios negócios, responsáveis pela geração de 60% dos empregos formais em 2024, segundo os dados oficiais.É o que avalia Sérgio Percelman, sócio do Almeida Prado e Hofmann Advogados. Para ele, a falta de clareza sobre o que constitui um “risco psicológico” ao trabalhador pode gerar insegurança jurídica. “O governo precisa fornecer orientação prática e incentivos fiscais para facilitar a adaptação das empresas, especialmente as de menor porte”, sugere.
Para se ter uma ideia da importância das pequenas e médias empresas, entre os meses de janeiro e setembro de 2024, elas foram responsáveis por seis em cada dez empregos criados. Um total de 1.231.276 postos de trabalho, segundo uma pesquisa feita pelo Sebrae a partir de dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).
O peso sobre esse naco do setor produtivo também preocupa o advogado Eduardo Maciel, sócio do Maciel, Fernandes, Basso e Dumas Advogados. O especialista concorda com a necessidade de investir em treinamentos, admite peso nos orçamentos das pequenas e médias empresas, mas destaca um ponto positivo. “Esses investimentos, embora onerosos, podem reduzir passivos trabalhistas e aumentar a produtividade a longo prazo.”
CUIDADO
Apesar de haver ainda mais dúvidas que certezas, os especialistas concordam que é necessário investir em ambientes mais saudáveis de trabalho. Para Maciel, as organizações precisam evitar “demasiada pressão ou cobrança, tampouco exigir da pessoa além do que ela é capaz de entregar”. Caso contrário, segundo ele, “a demissão seria a melhor forma das empresas lidarem com o assunto – com pagamentos de todos os direitos trabalhistas ou a contenção da exigência”.
Uma das principais novidades da norma é a obrigatoriedade do Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO), que determina que as empresas implementem um Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR). “A empresa deve conceder treinamentos sobre burnout, prevenção e tratamento, além de comprovar que adotou todas as medidas necessárias para evitar a doença”, explica Maciel.
Percelman ressalta que a nova norma exige que as empresas identifiquem e comuniquem os riscos psicossociais, implementando medidas para mitigá-los. “A empresa deve investir em treinamentos, programas de apoio à saúde mental e criar um ambiente que promova o equilíbrio entre vida pessoal e profissional”, afirma.
BURNOUT
A classificação da síndrome de burnout como doença ocupacional pela Organização Mundial da Saúde (OMS) também amplia a responsabilidade das empresas. Maciel destaca que, com essa nova classificação, os trabalhadores afetados têm direito a afastamento remunerado e estabilidade no emprego após o retorno. “Se o afastamento superar 15 dias, o trabalhador terá direito ao auxílio-doença do INSS e estabilidade de 30 dias após o retorno, podendo ser ampliada conforme a Convenção Coletiva”, explica.
Percelman acrescenta que o reconhecimento do burnout como doença ocupacional aumenta a responsabilidade dos empregadores. “O empregador deve comprovar que adotou medidas para prevenir a doença, como a criação de um ambiente de trabalho saudável e a realização de exames médicos periódicos”, diz.
Em casos de burnout decorrente de condições laborais inadequadas, as empresas podem ser responsabilizadas civilmente. Maciel alerta que o empregador tem a obrigação de demonstrar que forneceu um ambiente de trabalho adequado e treinamentos necessários. “Caso não consiga comprovar, a empresa pode ser condenada a pagar indenizações por danos morais e materiais”, afirma.
RISCO
Em situações extremas, a empresa pode ser responsabilizada por negligência e falha na prevenção. “Se o trabalhador morrer devido a complicações do burnout, os dependentes podem ter direito a pensão por morte”, alerta Percelman.
Para garantir conformidade com a nova regulamentação, os advogados recomendam que as empresas fortaleçam programas de compliance voltados à saúde mental. “A nova norma exige que as organizações documentem e comuniquem os riscos psicossociais, além de implementar medidas preventivas”, reforça Maciel. “Criar canais de denúncia e oferecer suporte psicológico aos trabalhadores também é essencial”, complementa.
Percelman conclui que a gestão de riscos psicossociais deve ser uma prioridade corporativa. “A empresa precisa realizar avaliações periódicas, treinar gestores para reconhecer sinais de estresse e promover uma cultura organizacional que valorize o bem-estar dos colaboradores”.
Fonte: Diário do Grande ABC