Por Beatriz Olivon — De Brasília
12/03/2024 05h00 Atualizado há 3 horas
Uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) aponta a possibilidade de contratação de diretor financeiro como pessoa jurídica – a chamada “PJ”. Ao analisar a questão, o ministro Dias Toffoli determinou que o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15), localizado em Campinas (SP), que já analisou o caso concreto, considere os precedentes do STF sobre o assunto.
A decisão monocrática (de um único ministro) é considerada, por especialistas, um importante precedente sobre a validade da contratação de profissionais qualificados como pessoa jurídica.
O caso envolve duas empresas de um grupo esportivo e um antigo diretor financeiro (CFO), que havia sido contratado como pessoa jurídica. No processo, ele alega que a relação disfarçava vínculo empregatício.
O pedido era para reconhecer o vínculo, no período de setembro de 2016 a março de 2018. O diretor alegou que teria sido “imposta” a ele a abertura de uma empresa (pessoa jurídica) e a emissão de notas fiscais para receber a remuneração mensal inicial de R$ 25 mil, com uma ajuda de custo de R$ 2,5 mil, além de reembolso de despesas com combustíveis e bonificação anual de três salários.
O argumento foi aceito pelo TRT-15. O tribunal ainda determinou, em favor do diretor, o pagamento de diferenças salariais e a inclusão, na condenação, do pagamento de bônus, além de direitos reflexos.
As empresas recorreram. Alegaram que a decisão contraria o precedente do STF que autorizou a terceirização da atividade fim (RE 958.252).
Argumentaram ainda que a decisão invalidou ajustes feitos que resultaram em benefícios para ambos os contratantes. Apontaram também que o STF tem reconhecido que profissionais esclarecidos e hipersuficientes podem exercer sua autonomia negocial e adotar formas de divisão de trabalho diferentes da relação subordinada, sem que isso configure fraude ou ilegalidade.
Segundo o advogado que representa as empresas no processo, Jorge Matsumoto, sócio do Bichara Advogados, o caso reflete a flexibilidade necessária nas relações de trabalho modernas e reafirma a importância da autonomia das partes na definição das relações contratuais.
Para Matsumoto, os precedentes da própria Corte citados na decisão de Toffoli, como o que autorizou a terceirização da atividade fim, “reforçam a ideia de que o direito do trabalho deve evoluir em consonância com as transformações do mercado de trabalho e as novas formas de organização produtiva”.
Para Toffoli, as empresas têm razão quanto à alegada violação dos julgados paradigmas, “uma vez que o TRT-15, desconfigurando a relação contratual autônoma entre pessoas jurídicas, reconheceu o vínculo de emprego”. Toffoli, então, devolveu o processo para o TRT-15 fazer uma nova análise, “à luz dos precedentes do STF de observância obrigatória e da decisão na presente reclamatória” (Reclamação nº 65.868).
A decisão monocrática foi proferida na análise de uma Reclamação Constitucional, recurso que leva uma ação direto ao STF.
Segundo a advogada Aline Cunha Borges, da área trabalhista do escritório MFBD Advogados, a decisão não autorizou expressamente que o diretor financeiro fosse PJ. Mas cassou a decisão do TRT-15, determinando que reanalise as provas, conforme precedentes do STF.
Já a advogada Líbia Alvarenga de Oliveira, sócia do Innocenti Advogados, destaca que precedentes do STF indicam a possibilidade de estipular contratações diversas das regidas pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Também de acordo com ela, essa permissão é considerada válida desde que não haja vulnerabilidade na opção por contrato diverso que justifique a proteção estatal.
“Essa postura reflete a necessidade de adaptação às transformações nas formas de trabalho impulsionadas pelo dinamismo do mundo contemporâneo”, considera Líbia. A advogada lembra que ainda é possível recorrer no próprio STF da decisão. No processo não consta representação do tribunal ou do diretor.
Fonte: Valor Econômico